NBB no bote da NBA

Comentei nessa semana, na nossa página no Facebook, que estava pensando em falar de NBB aqui a partir da próxima temporada. Não decidi absolutamente NADA de como será o próximo ano do blog, mas andei pensando nisso e queria saber o que nossos queridos e amados leitores achavam da ideia. Em geral as respostas ficaram entre duas variáveis: (1) Sim, vai ser legal e (2) Tudo bem, desde que não deixem a NBA de lado.

A ideia não é deixar a NBA de lado, mas apenas dar uma mudada no blog. Acompanhei o crescimento do basquete aqui no Brasil nos anos em que trabalhei como assessor no Paulistano e me sinto interessado e informado o bastante para fazer uma cobertura. Também vai ser legal poder escrever do basquete com maior chance de ir aos jogos, conseguir eventuais entrevistas e oferecer material de primeira mão. Na NBA, que pretendo continuar acompanhando com textos enormes e analíticos como sempre, quase sempre somos obrigados a opinar apenas depois de ler o que foi dito lá fora.

De qualquer forma, foi uma feliz coincidência que dias depois dessa mini enquete facebookiana, o Bala na Cesta chegou com o furo mais interessante do ano no basquete brasileiro: a NBA e o NBB estão próximos de fechar uma parceria de três anos! Parece até combinado. Interessante que você leia, também, a análise que o Bala já fez no blog dele sobre o assunto.

Amistosos do Flamengo contra times da NBA foi primeiro indício da parceria

Amistosos do Flamengo contra times da NBA foi primeiro indício da parceria

Como vocês viram por lá, a parceria ainda não foi oficialmente assinada e anunciada, mas só um desastre poderia cancelar. Sem ser oficial e com os dois lados mudos, só podemos especular a extensão do acordo, e é isso que eu vou fazer aqui!

Começamos comentando o mais óbvio, os motivos que levariam a Liga Nacional de Basquete, que gere o NBB, a assinar uma parceria com a NBA. Há 2 anos que a liga tem dificuldade de encontrar grandes patrocinadores e, sem dinheiro, nada funciona como deveria. O grande mérito da história do NBB são as novas ideias para criar uma liga moderna e organizada, mas sempre o progresso para quando o assunto dinheiro bate na porta. Eles sabem que a liga precisa investir mais em comunicação? Sim. Que sem vídeos dos jogos é difícil atrair novos fãs? Sim. Que times fracos e muito concentrados em só uma parte do país não ajuda na imagem nacional da liga? Sem dúvida. Mas como resolver isso sem as verdinhas? Muitas das responsabilidades acabam ficando nas mãos de clubes, que nem sempre dão a importância necessária ou tem o dinheiro para investir corretamente em todas as áreas.

Nos últimos anos vimos alguns times não conseguirem o mínimo de dinheiro para participarem do campeonato e outros, em outros cantos do país, terem o projeto, a ideia, o público, mas não conseguir tirar a equipe do papel. Tem gente interessada, existem projetos, mas sempre param na grana e a liga não pode ajudar porque ela mesma sofre nas verbas.

A chegada da NBA pode resolver todos esses problemas de uma vez só. Só colocar o nome da liga americana ao lado de alguma coisa que deve ficar umas 100 vezes mais fácil atrair investimento e patrocínio, sem contar o próprio dinheiro que a NBA tem e pode usar para investir em um novo mercado. Também podemos acreditar que eles vão saber usar a grana. Apesar de novos no ambiente brasileiro, tem experiência de décadas e décadas com logística do esporte, marketing esportivo, arbitragem e na evolução de questões técnicas do jogo. TUdo o que precisamos por aqui. Ou seja, não só eles vão chegar aqui dizendo que é importante transmitir jogos pela internet, eles vão dizer que sistema usar, como cobrar, quanto cobrar e como exibir.

Que outra chance a Liga Nacional de Basquete teria como essa? Se associar com alguém que tem dinheiro, reconhecimento na área e know-how de tudo o que envolve esporte. Topar a parceria, seja ela como for, deve ter sido bem fácil. Fica a curiosidade, por enquanto, para ver como isso influencia a outra parceria importante da Liga, a com a Globo, que sempre concentrou a questão da comunicação do campeonato.

O que não devemos esperar, porém, é uma revolução imediata. Posso não ser nenhum mestre em negócios, mas imagino que não se chegue num país estrangeiro, com outra cultura, e se mude tudo de uma vez para deixar o mais ianque possível. Se não dá certo nem com redes de fast food, não dará com uma liga de basquete. Eu apostaria que o primeiro ano será mais de consultoria do que qualquer outra coisa. Dá pra imaginar uma equipe da NBA designada para acompanhar a temporada do basquete nacional para ver os problemas, imaginar soluções e aprender sobre como lidamos com o esporte por aqui.

NBB

Nos últimos dias eu pensei bastante sobre os motivos que levou a NBA a pensar nessa parceria e achei algumas boas razões, embora só eles possam, um dia, realmente listar tudo o que passou na cabeça de negócios dos americanos. Pensem bem, qual seria o caminho natural para uma parceria da NBA em termos de basquete? A Europa. A aproximação até tem acontecido nos últimos anos: diversos amistosos acontecem nos EUA e na Europa, alguns times americanos fazem pré-temporada por lá e até na série 2K já vimos times do velho continente. Mas imagino (relembro, tudo aqui é especulação minha) que algumas barreiras são difíceis de transpor: por exemplo, as ligas europeias não veem a NBA mais como rival do que como parceira? E como lidar com o fato de que o “basquete europeu” é, no fim das contas, uma soma de diferentes ligas, países e com líderes distintos?

Por exemplo, acho que a ACB espanhola se interessa muito por amistosos contra times da NBA, mas uma parceria mais profunda do que isso iria significar o que? Certamente alguns dos salários milionários, em euros, que Real Madri e Barcelona gastam são para segurar por lá astros que poderiam facilmente jogar em muitos times da NBA. É estranha uma parceria entre ligas que lutam pelos mesmos atletas, muitas vezes bem novos e promissores. E se é fechada uma parceria com a Espanha, que já é bem autossuficiente e não desesperada como a LNB, como lidar depois com os times russos, gregos e turcos? É muita dor de cabeça para se meter em um mundo onde o basquete já está enraizado, tem sua cultura e seus grandes campeonatos.

E aí eles podem desviar o olhar para o Brasil: 200 milhões de habitantes, economia forte, público consumidor de basquete, 5º país que mais tem assinantes do League Passs da NBA. O nosso país consegue, ao mesmo tempo, ter história em basquete, com títulos, ídolos e praticantes; mas também não ter muitos times tradicionais, ricos ou mesmo uma liga forte e estabelecida. Para a NBA, o Brasil é como uma tela em branco onde eles podem intervir e se fazer como desejam e, melhor, sem ter que explicar o be-a-bá durante o processo. Pensem bem, a MLB também pode ver no Brasil um país de 200 milhões de habitantes e que não tem liga de beisebol forte, mas aqui eles perderiam uns bons anos só para nos convencer que beisebol é um esporte de verdade e que vale a pena passar 5 horas num estádio enquanto se aprende as regras. O basquete é jogado, aceito e entendido. Mesmo quem não acompanha, não estranha ver uma tabela por aí, sabe o que é e não enxerga como “esporte americano” ou coisa do tipo. É uma situação única e ideal para ser aproveitada.

Varejão NBB

Como eu disse antes, podemos apenas especular o que essa parceria vai trazer a curto e longo prazo, mas eu pensei em coisas que poderiam ajudar os dois lados, tornando o NBB uma liga mais interessante e, ao mesmo tempo, útil para a NBA. Isso, claro, indo além do mais básico: uma liga forte no Brasil rende mais fãs do basquete que, sem dúvida, vão ligar no League Pass para ver os melhores do mundo.

Liga Menor: Há tempos que se discute nos EUA a criação de Ligas Menores, subdivisões, como no beisebol, onde os times da NBA iriam trabalhar os seus jovens jogadores. A ideia mais extrema, longe de virar realidade, teria jogadores saindo do colegial e pulando a faculdade para irem se desenvolver nessas D-Leagues até serem, enfim, chamados para a NBA. Os times profissionais teriam mais controle sobre a formação dos atletas e estes ganhariam salários ao invés de serem escravos das universidades.

O Brasil poderia servir como uma “liga menor” para o desenvolvimento dos mais diversos tipos de atletas. O Houston Rockets descobriu um promissor pivô uruguaio? Bora mandar ele jogar em Bauru por uns dois anos para que os scouts deles o observem de perto. Os salários podem ser pagos por um dos times, pelos dois ou seja lá como for melhor para todos os lados. Talvez isso não funcione com todos, claro, talvez um jovem americano não se sinta à vontade de atravessar o mundo para se desenvolver aqui, mas certamente seria um caminho para talentos latinos, incluindo os próprios brasileiros. Já pensou o NBB infestado com os melhores jogadores argentinos, uruguaios, venezuelanos, dominicanos e porto-riquenhos? Seria demais!

Intercâmbio: Os EUA produzem técnicos a rodo, desde ex-jogadores até estudiosos da área. Agora, no mundo das estatísticas e análise tecnológica do esporte, diferentes empresas aparecem todos os dias com novas ideias e inovações. Com concorrência na NBA, muitos deles poderiam vir para o Brasil para ganhar experiência e, ao mesmo tempo, ajudar em nosso desenvolvimento técnico. E que tal um combinado jovem do NBB disputando as Summer Leagues, como já fazem com a D-League?

Mão de obra: Comprar uma empresa menor é também garantir que tudo revelado por lá pode ser aproveitado pela irmã mais velha. Pensando em longo prazo, a NBA pode investir no NBB para ter acesso mais rápido ao que for produzido aqui. A princípio pode ser apenas o que temos de melhor, os atletas, mas quem sabe, no futuro, também não surjam soluções em outras áreas como o marketing esportivo e a medicina esportiva.

Laboratório: Nos últimos anos virou moda a NBA discutir mudanças de regra, calendário e estrutura do campeonato. Já falaram em uma “Copa” no meio da temporada, valendo um segundo troféu em jogos únicos de mata-mata; linha de quatro pontos; mudança no sistema de faltas técnicas e faltas intencionais; quadras maiores; sistema de rebaixamento. Até o fim das conferências e mais viagens entre os jogos podem ser experimentadas por aqui! Será que o nível do basquete daqui cairia se existissem times em todos os lados do país e os times viajassem mais que o normal? Teste no Brasil.

Liga Sul-Americana: Não podemos esquecer que embora o Brasil seja o ponto de partida na América do Sul, não precisa ser o único atingido. A NBA tem ambição internacional e eu não me surpreenderia se dentro de alguns anos, eles sugerissem a adição de equipes de Buenos Aires, por exemplo, no nosso campeonato. Seria o nosso Toronto Raptors, útil para atrair até mais argentinos, celeiro próspero de jogadores com potencial de NBA.

Leandrinho

Sei que talvez não seja tão bom para nossa autoestima nos enxergar como laboratório e fornecedor de mão de obra para um país rico, mas temos sempre que lembrar que há poucos anos nós não tínhamos campeonatos organizados no país, que a Confederação nacional é uma várzea e que passamos mais de década sem pisar nos Jogos Olímpicos. Difícil sair da lama e ser o poderoso logo de cara. De qualquer forma, assim como estar mal das pernas não era motivo para aceitar todas as ordens da Globo, o mesmo vale para a NBA, embora eu ache que a liga americana tem mais interesse em ver o desenvolvimento técnico do basquete daqui do que a emissora de TV.

Posso estar indo longe demais, admito. Talvez a ideia da NBA seja só ajudar com o básico (estrutura, logística, investimento e comunicação) e manter um elo fechado com um mercado em expansão, mas as possibilidades estão aí e o tempo nos dirá a ambição de cada parte.

Ta olhando o que? “Hello Brooklyn”

Quando foi anunciada a compra do New Jersey Nets por Jay-Z, muitos ficaram na dúvida se a notícia era bombástica porque mais um artista famoso estava adquirindo uma franquia da NBA ou simplesmente porque raios alguém compraria os Nets. O fato é que ocorreu. A notícia não só bombou nos veículos esportivos, como estavam lá outros sites e revistas especializados no entretenimento baseado na vida alheia mandando ver na fofoquinha da vez.

Um tempo depois mais uma notícia que deixou todo mundo “bege”, New Jersey no more. A franquia estava se mudando para o Brooklyn. O distrito é um dos mais importantes e conhecidos da cidade de Nova Iorque, com características muito próprias, culturas variadas, meio gueto, meio judaica, meio testemunhas de joevá, meio “cena artística independente”. Jay-Z nasceu no Brooklyn.

Bom ou ruim, surpreendente ou não, o importante pra mim foi o incrível “redesenho” da franquia. Na minha opinião, uma das identidades visuais da NBA mais bonitas que já vi até hoje.

Jay-Z não só nasceu e tem orgulho do distrito, mas também vive o Brooklyn. É aquela velha história a la Adriano: Você tira o cara da favela, mas não tira a favela do cara. E o novo conceito visual da franquia nasceu exatamente daí, do gueto.

Como tendência já usada por outras equipes, os Nets apostaram no retrô minimalista da coisa. Linhas simples, cores chapadas, nada de degradês, volumes, logos em 3D. O negócio foi preto no branco, literalmente. E o melhor, o preto no branco acompanhado dos anos 70. O logo parece que foi chupinhado de um filme sobre alguma equipe do high school de 1970 que a molecadinha superou tudo, tirou boas notas e ganharam o campeonato regional (Samuel L. Jackson deve ter participado desse filme também), e é lindo!

A simplicidade de coisa, o conceito, o enaltecimento de toda uma comunidade, os tons de cinza, fotos em P&B, a cara e a alma gangsta, tudo impecavelmente bem executado. Os Nets automaticamente sairam de uma equipe “coxinha”, com bons jogadores, e visualmente se tornaram uma equipe “treta” em que até Brook Lopez parece que vai sacar uma magnum a qualquer momento e sentar o dedo na geral.

Jay-Z fez mais do que comprar uma franquia. Ele simplesmente presenteou o Brooklyn e a NBA com uma equipe que vive um estilo de vida, uma causa. O sucesso dos Nets em quadra já é esperado e todos sabem até onde eles vão chegar. Mas o que vejo é uma equipe que, num futuro próximo, possuirá uma das torcidas mais fanáticas da NBA.

Abaixo deixo algumas imagens dessa beleza.


>Funeral

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Basta que Greg Oden e Yao Ming olhem um para o outro para que se lesionem

Já escrevi minha despedida ao Yao Ming faz tempo, mais de um ano atrás. Na época, a lesão no tornozelo adquirida na série de playoff contra o Lakers já havia se mostrado mais problemática do que se esperava, tudo indicava que ele perderia toda uma temporada da NBA e que, quando voltasse, teria minutos limitados em quadra. Era o decreto de que sua carreira não guardava mais surpresas, e lhe restava apenas um papel secundário no mundo do basquete. Sua função de unir o mercado americano e o chinês, derrubar fronteiras culturais entre os dois países e voltar os olhos do mundo para a NBA numa época em que o interesse do público diminuia mais e mais já estava completa. Yao Ming parecia se despedir aos poucos das quadras deixando como legado uma NBA que lucra horrores com consumidores chineses, e uma China que vê o resultado de um longo processo de reconstrução de sua própria imagem. Seu lugar na história independe, portanto, de seu rendimento nas quadras a partir de agora. Basta aquilo que ele apresentou no pouco tempo em que esteve saudável o bastante para competir em alto nível. Mas é impossível não ficar triste com sua aposentadoria. Que se dane a história, seu papel na cultura chinesa, seu legado para o mercado, a camiseta dele que eu comprei aqui no Brasil. O que realmente importa é outra coisa: o Yao jogou basquete a vida inteira, ama o basquete, e é o que ele sabe fazer de melhor. Nunca é legal, não importa qual tenha sido seu papel na história, ser obrigado a parar de fazer aquilo que você ama.

É por isso que recebi com alegria os relatos de que sua recuperação havia sido fantástica. Ele voltou a treinar novamente, recebeu um lugar garantido na equipe para essa temporada e não sentia mais nenhum rastro da lesão. Era possível imaginar que o Yao seria uma versão bizarra do Ilgauskas, que também sofreu lesões similares e que nunca mais foi estrela em quadra, se movimenta como se estivesse correndo dentro de uma piscina, mas consegue ajudar e muito qualquer equipe em que estiver com seus arremessos. Mas quanto nos aproximamos do começo da temporada, surgiu a notícia de que os minutos de Yao Ming seriam limitados a 24 por partida, no máximo. Não porque ele estivesse fora de ritmo, preocupado com a lesão ou cansado dos trabalhos nas férias, mas sim porque finalmente os médicos de Houston foram capazes de enxergar a verdade: um ser humano não deveria correr de um lado para o outro por 82 partidas inteiras por temporada tendo 2,29m de altura. Nenhuma estrutura óssea foi concebida para essas proporções.

É claro que tentamos esconder essa verdade. Queremos que os jogadores corram, se esforcem, joguem com garra e potência, alcancem um aro colocado lá no alto, e nos entretenham enquanto fazem isso por 82 vezes em um ano, fora os playoffs. Poucos corpos podem suportar esse tipo de coisa, independente de sua altura. No caso de Yao, isso é ainda mais terrível. Rapidamente os 24 minutos por partida mostraram que não seriam suficientes para salvar sua carreira e a lesão combatida por mais de um ano voltou novamente. Essa é, então, uma despedida final – e eu não vou ter nenhuma vergonha de ficar brega nela, combinado?

Com Yao jogando minutos limitados, meu Houston Rockets não iria muito longe na NBA, provavelmente chegaria aos playoffs mas não teria reais chances de título. Yao sabia disso e reclamava constantemente da limitação, queria ficar mais em quadra, sabia que podia render mais se ficasse mais tempo em jogo – e o time, como já comentei aqui, pararia de sofrer com uma terrível falta de padrão de jogo. Pelo modo como estava jogando, realmente poderia levar o time nas costas se tivesse mais oportunidades. Mas seu fisico não permitiria e sabotou novamente sua temporada na primeira oportunidade. Yao não queria ser o Ilgauskas, queria quebrar o limite de minutos, não queria ficar mofando no banco. Como ele será capaz de lidar, então, com uma aposentadoria inevitável?

“Eu não morri”, foi sua resposta. “Nesse momento estou bebendo uma cerveja e comendo frango frito. O que vocês estava esperando, um funeral?”

Seu contrato termina nessa temporada e nenhuma equipe lhe dará milhões apenas para frequentar o departamento médico. Mesmo que ele ainda sonhasse com mais minutos, que ele quisesse mais oportunidades, sua aposentadoria será praticamente forçada. No entanto, não há nenhum funeral. Yao já havia dito que o mais importante é que ele pudesse levar uma vida saudável fora das quadras, brincar com sua filha, sair com sua esposa. Sim, ele tem uma filha. É claro que quando se sente saudável a história é outra, ele quer entrar em quadra e produzir mais e mais, mas não lhe falta a consciência de que o basquete está em segundo plano frente à saúde necessária para seguir uma vida normal. Yao agora é um homem casado, com um filhinha que não tem nem 1 aninho ainda, e construiu uma vida fora das quadras. É triste que ele não possa jogar basquete, ele se esforçará para voltar, mas durante todos esses anos de carreira ele construiu uma vida adulta na qual pode se escorar.

O Houston Rockets não é bobo nem nada. Sabe que Yao tem uma das personalidades mais cativantes da NBA nas últimas décadas e conhece bem os lados positivos de ser bem visto pelo mercado chinês (que compra qualquer coisa com a marca do Rockets, até tênis do Shane Battier ou do cocô do Rafer Alston), então já avisou que manterá Yao por perto. Ele pode até ter seu contrato renovado por uma ninharia só pra estar no banco, mas deve mesmo é virar assistente técnico, auxiliar, engravatado, burocrata, garoto da água, qualquer coisa que exista ao redor do basquete. A vida continua, e Yao teve a sorte de ter sido capaz de construir uma vida por entre as frestas que a NBA permite a seus funcionários que nunca descansam.

Não podemos dizer o mesmo de todos os jogadores, no entanto. Greg Oden, por exemplo, sofre com lesões desde seu primeiro minuto na NBA e não teve tempo de construir coisa nenhuma. Assim como Blake Griffin, Oden não jogou uma única partida sequer em sua primeira temporada, então estreiou como novato apenas em seu segundo ano de NBA. O Blake Griffin voltou voando, pulando até a Lua para dar uma passeada, mas o Oden voltou com muitas dificuldades. Primeiro pelo físico, com o joelho que ainda incomodava. E depois pela sua personalidade, tão insegura dentro e fora das quadras. Ainda no hospital depois de sua primeira cirurgia no joelho, Greg Oden pediu desculpas em prantos para o dono do Blazers, prometendo que ele não se arrependeria de tê-lo draftado. Oden tem medo de não conseguir ser aquilo que esperavam dele, tem medo de não levar ao campeonato um time que só precisava dele para ter chances reais de título. Admitiu que as críticas lhe comiam o cérebro, e que as reações da torcida de Portland lhe tiravam completamente a cabeça do jogo. Quando começou a pegar confiança devagarinho, se contundiu de novo. E de novo. Esperava voltar às quadras nessa temporada mas constantemente viu as previsões sendo adiadas, até que teve que fazer nova cirurgia e perderá toda essa temporada. Não será, como no caso do Yao, uma
impossibilidade de sua estrutura física? Mas Oden tenta ao máximo escapar dessa teoria:

“Me perguntam bastante: você acha que seu corpo simplesmente não foi feito pra isso, ou você é só azarado? Mas tem que ser que eu sou só azarado.”

Greg Oden se agarra como pode ao azar, e fico feliz que seja assim. Afinal, nos últimos anos sua tendência foi sentir-se culpado, como se ele tivesse algum controle sobre as lesões que sofre. As pessoas criticaram tanto o coitado por não conseguir ficar saudável que ele começou a acreditar que era um merda e responsável pelo que acontecia com ele. Procurou uma série de especialistas para saber se fazia algo errado, se seu corpo era mal formado, se havia alguma questão óssea. No final, o único especialista que o ajudou foi um psicólogo, alguém para lhe explicar que um garoto de sua idade não deveria lidar com esse tipo de culpa ou pressão. Agora ele acha apenas que é azarado e vai continuar se reabilitando até que seu corpo desista de ficar lhe puxando o tapete. Mas a pergunta é: e se o corpo dele continuar se desintegrando?

Greg Oden tem apenas 22 anos. Não tem uma vida formada e nem fez nada relevante na NBA. Não receberá ofertas para cargos técnicos ou executivos, e nem tem um povo que lhe apoia incondicionalmente. Não tem muitos amigos, está sempre isolado dos seus companheiros de equipe porque treina em separado, e não tem nada no que se segurar caso não possa mais jogar basquete. Enquanto isso, o Blazers simplesmente se esfarela embaixo dos seus pés, porque o time reuniu talento demais, jovem demais, e a falta de um grande pivô podou as chances reais da equipe nos playoffs antes que os egos se chocassem. Agora, os jogadores do Blazers querem mais dinheiro, mais minutos, mais arremessos, mais a bola nas mãos, e parece que a chance de ganhar um anel com esse elenco se perdeu nas lesões do Greg Oden.  O grupo virou um barril de pólvora e o Oden continua lá se sentindo o pior dos mortais, o homem em que se colocou todas as fichas e não conseguiu sequer entrar em quadra. É tipo o Kwame Brown, mas ao invés de feder, foi o corpo que lhe deixou na mão – o que pode ser ainda mais frustrante.

Se já é injusto o tipo de ódio e agressividade que o Kwame recebe por ser ruim, ignorando todas as suas questões psicológicas e as dificuldades que passou na vida, o tipo de coisa que se diz sobre jogadores que estão constantemente lesionados é mais injusta ainda. Como se o Oden, ou o Yao, ou qualquer um, preferissem andar de muleta do que estar chutando traseiros nas quadras. Eu sei que, nos minutos que teve, o Greg Oden não era nenhum gênio e cometia uma falta toda vez que tentava coçar o nariz, mas não temos sequer como imaginar como ele seria se tivesse um pouco de tranquilidade, padrão de jogo e consistência de minutos. Talvez fedesse, talvez fosse uma estrela, sei lá. As exigências físicas da NBA não permitirão que possamos ter um julgamento sobre o pobre do Greg Oden.

Só sei que a NBA seria mais divertida com Yao Ming e Greg Oden. Finalmente vemos a retomada do jogo de garrafão na NBA, com uma nova e habilidosa geração de pivôs chutando traseiros todas as noites, mas Oden e Yao apenas acrescentariam a esse grupo. As lesões não apenas retiram das quadras jogadores divertidíssimos de acompanhar, elas também limitam jogadores que continuam competindo. Estrelas jovens como Brandon Roy e Tyreke Evans já estão caindo aos pedaços, e já não consigo lembrar qual foi a última vez que Kobe Bryant entrou em quadra completamente saudável. Mesmo os que continuam atuando em alto nível estão baleados, como o Kobe e seu dedo que daqui a pouco vai desistir dele e transformar o Kobe no Lula. Eu, como fã, estou disposto a diminuir o número de jogos de uma temporada para poder ver mais jogadores capazes de jogar com todas as suas forças, mais gente saudável no ápice de sua forma física, e mais jogadores que de outra forma abandonarão as quadras. O espetáculo agradeceria o menor número de jogos em uma temporada ao ver Yao Ming e Oden se enfrentando, e um Kobe saudável marcando 81 pontos numa partida. E, se deixarmos o espetáculo de lado e notarmos que os jogadores são pessoas, gente comum com dores e medos e vidas dedicadas a um esporte que lhes toma todo o tempo, a redução do tamanho da temporada é ainda mais urgente.

Já levantamos aqui a questão de um novo modo de estrutura salarial para a NBA, em que o jogador seria pago por minutos jogados e que leva os técnicos a colocarem sempre seus melhores em quadra, independente de quem sejam, e cada jogador receberia por sua importância na equipe. O Denis acabou de levantar a questão sobre a diminuição do número de times na Liga, o que aumentaria a qualidade das equipes restantes. Lavantemos também, já que estamos nessa utopia inofensiva, uma temporada de NBA em que todos os times se enfrentassem apenas duas vezes, em regime de ida e volta. Seriam 58 partidas por temporada, com mais tempo para descanso e sem as temíveis partidas em dias seguidos que o Denis já apresentou com detalhes. Às vezes, é preciso repensar toda uma estrutura que parece funcionar porque algumas coisas dentro dela não funcionam. Temos jogos demais, não há como questionar esse verdade.

A falta de Yao Ming me enche de tristeza, e nem quero discutir suas qualidades técnicas com os odiadores por aí. Só acho importante direcionar o ódio por esses jogadores constantemente lesionados para o lugar certo. Greg Oden diz que as pessoas lhe olham com raiva e perguntam, indignadas, se ele está lesionado “outra vez”. Sim, ele está, e não pode controlar. Essa agressividade idiota deveria se voltar para o exagero no calendário do esporte que amamos, e que o torna cada vez mais e mais desfalcado, diluído, porque insistimos em colocar cada vez mais água no feijão.

>Não farei uma piada com a frase "Houston, nós temos um problema"

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Facepalm!

Quando o Houston Rockets, na temporada passada, estava chutando uns traseiros e surpreendendo todo mundo apesar da ausência de Yao Ming, o maior pânico do técnico Rick Adelman era que Tracy McGrady ficasse saudável novamente. Não importava que T-Mac fosse uma estrela, e que pudesse vencer um ou outro jogo sozinho – a dúvida diária sobre ele entrar em quadra ou não, dadas suas lesões constantes, não valia a pena. Nada é tão eficiente para acabar com um time do que lhe tirar a certeza da rotação, dos papéis em quadra e do padrão de jogo. Uma equipe que tem que jogar de um jeito diferente todas as noites não aguenta o tranco. Aquele Warriors do Don Nelson, em que os jogadores nunca sabiam se iam jogar, por quantos minutos, e em qual posição, era um pesadelo kafkaniano. Aposto que jogadores como o Marco Belinelli até hoje acordam chorando no meio da noite após um pesadelo em que o Don Nelson é contratado para treinar o Hornets. O Belinelli agora está muito bem obrigado, e o próprio Warriors é um time bastante diferente só de saber quem vai entrar em quadra.

Mesmo estando supostamente saudável, o Houston se livrou do T-Mac o mais rápido que conseguiu. Agora ele está lá no Pistons e mesmo jogando cada vez mais minutos ainda é uma dúvida constante, nunca dá pra saber se ele estará em condições de jogo. Somando isso ao fato que o Pistons não faz ideia se está tentando vencer ou se está reconstruindo o time, temos casos bizarros como o Austin Daye ser titular num dia e sequer entrar em quadra no outro. E os resultados são sempre catastróficos.

O Houston da temporada passada, sem T-Mac, não foi para os playoffs – mas foi por pouco. Com Kevin Martin na melhor forma física da carreira, as chances de se sair melhor nesse ano eram grandes. Mas aí o Houston passou a lidar com a volta de Yao Ming. Seria ridículo achar que o time piora com sua presença em quadra, pelo contrário, só de estar lá existindo e respirando, sem nem levantar os braços, o Yao Ming já faz o Houston um time melhor. Seu tamanho por si só altera infiltrações no garrafão defensivo e cria espaços ao ser marcado no garrafão ofensivo. Mas seus minutos limitados por ordens médicas (sempre os sugestivos 24 minutos por jogo) e a proibição de jogar em dias seguidos trouxe para o Houston aquele fantasma de Tracy McGrady.

Quando Yao está em quadra, o time precisa aproveitá-lo ao máximo, afinal ele terá que ir para o banco em breve. E isso é até bom, porque os passes chegam em sua mão e o time é realmente melhor quando as jogadas ofensivas se focam nele e em sua capacidade de passar a bola para o perímetro. Mas quando ele senta e não pode mais entrar em quadra, é como se o time inteiro precisasse encontrar um outro modo de jogar que tivesse esquecido durante o jogo. Os jogadores não estão envolvidos, as movimentações de bola precisam ser diferentes, é como começar um novo jogo no meio de outro. E aí, no jogo seguinte, caso seja um jogo em dia seguido, Yao está fora desde o começo da partida, então é preciso se acostumar com Brad Miller em quadra. Mas no jogo seguinte é o Yao Ming quem joga, e aí a bola tem que ir pra ele. E assim o Houston não tem padrão nem ofensivo, nem defensivo.

É claro que os problemas se extendem: com a saída de Trevor Ariza para dar espaço para Kevin Martin, a defesa de perímetro do time sofre um absurdo. Tirando Yao Ming, nenhum jogador do elenco é capaz de dar um único toco, então impedir infiltrações é ainda mais essencial – coisa que Kevin Martin e Aaron Brooks não conseguem fazer. Kyle Lowry, que é um defensor melhor na armação, passou todo o começo de temporada contundido. Quando voltou, Aaron Brooks já estava fora e assim permanecerá por mais um mês. E o próprio Yao Ming, quando começou a reclamar que deveria no mínimo voltar a jogar partidas em dias seguidos para não ferrar com a química do time, acabou torcendo o pé e ficando fora pra valer. E com o Yao nunca tem lesão simples, a torção deixou uma lasca de osso no pé dele, e o tempo de recuperação foi mais longo do que o esperado. O retorno deve ser no comecinho de dezembro.

Mas dentre todos esses problemas, o que mais afeta o Houston é mesmo a impossibilidade de criar uma rotação e um padrão de jogo definidos. As primeiras derrotas da equipe foram todas por muito pouco, nos minutos finais, em bolas decisivas. Era preciso manter um ritmo e deixar que o time aprendesse a fechar os jogos. Mas não, a rotação mudou tanto que a equipe não sabe mais o que precisa fazer para mudar o placar da noite anterior. Uma hora joga com Brad Miller, que arremessa de três e não defende, na outra joga com Chuck Hayes, que só defende mas é nanico, aí coloca o Jordan Hill em quadra, que consegue pular mas é desmiolado. Não seria surpresa uma hora dessas o Tiririca entrar em quadra e passarem a bola pra ele normalmente, como se nada estivesse acontecendo. Não basta apenas ficar esperando o Yao Ming voltar de contusão e rezar pra ele não se contundir de novo – o que já é difícil o bastante – porque quando ele estiver em quadra ainda haverá incerteza, minutos limitados, padrões diferentes de jogo. Nessas circunstâncias, a temporada do meu Houston provavelmente foi pelo ralo.

As coisas no Miami Heat são um tanto parecidas. Não tem ninguém com minutos limitados, mas assim que o time começou a mostrar fraquezas e precisava buscar um ritmo para engrenar, começou a ficar claro que quase todo mundo lá é quebra galho e não tem, ainda, papel definido. Culpa, em parte, das contusões. Mario Chalmers poderia ser titular na vaga do Carlos Arroyo, mas se machucou nas férias e ainda está fora de forma. Mike Miller poderia jogar de SF para que finalmente o LeBron pudesse ser escalado oficialmente como PG e resolveria, em parte, as dificuldades da equipe com o arremesso de três pontos, mas ele só volta no fim de dezembro. Udonis Haslem, que não decidiram ainda se é reserva do Bosh ou se joga ao lado dele, sofreu uma lesão séria no pé e agora pode estar fora por toda a temporada. E para tapar o buraco no garrafão, o Heat acaba de contratar Erick Dampier, que pega a temporada no meio e vai ter que correr tanto na parte física quanto na parte tática.

Todo mundo tinha aquela pergunta básica sobre o Heat, “quem é que vai decidir os jogos?”, mas essa é menor das preocupações do elenco. Wade e LeBron continuam batendo cabeça no perímetro porque nenhum deles é um arremessador consistente de três pontos, e a resposta para isso nunca aparece porque uma hora o James Jones está em quadra, outra hora é o Eddie House quem tem mais minutos, tem hora que o Arroyo é que arremessa mas sempre com a incerteza sobre ter a posição porque ele não defende nem tem a função de armar o jogo, tem hora que é o Wade o responsável pela armação, o Mario Chalmers é sempre um dúvida se vai entrar ou não, e o Mike Miller continua lá lesionado e com cara de menina. Sabe como o Pacers deu um pau no Heat? Toda vez que LeBron e Wade fizeram o pick-and-roll, a marcação da equipe de Indiana deixou o armador livre e seguiu os jogadores de garrafão, fechando o caminho para a cesta. Pronto! Não requer prática tampouco habilidade! O treinador do Pacers, Jim O’Brien, chegou a dizer que se o Heat tivesse acertado alguns dos seus arremessos teria dado uma surra no P
acers, porque é sempre uma tática arriscada deixar jogadores tão bons constantemente livres para arremessar. Mas nessa equipe em que os coadjuvantes não têm papéis e rotações definidas, sem arremessadores de três designados, dá pra arriscar numa boa.

O meu Houston vai ter que tomar decisões duras que vão definir, agora, a carreira de Yao Ming. Quando voltar da nonagésima contusão de sua vida, jogará em dias seguidos? Continuará jogando apenas 24 minutos? Vale a pena arriscar a saúde de um jogador numa temporada praticamente perdida? Pior: vale a pena manter um jogador que pode arriscar sua saúde num time de temporada perdida? Como o contrato do Yao termina ao fim dessa temporada, o Houston precisa decidir até onde está disposto a seguir com essa bagunça – e começar a dar as respostas agora, o quanto antes, para definir o que fará mais para frente.

No caso do Heat, parte da solução para o problema é aguardar os jogadores voltarem de contusão, mas o mais importante é tomar um banho de água bem gelada. O time precisa de estabilidade na rotação e nas funções em quadra, mas como esperava estar vencendo tudo logo de cara e todo mundo quer arrancar o coitado do técnico Erik Spoelstra de lá para colocar seu chefe Pat Riley no lugar, cada hora o time acaba tentando um troço novo pra ver se funciona. Não dá pra criar um padrão se o técnico precisa fazer qualquer coisa pra vencer ou seu emprego vai pro saco, o cara nunca vai pensar em criar uma equipe a longo prazo, ele vai pensar é em pagar o leitinho das crianças. O Spoelstra é um bom técnico, ele só está com a cabeça a prêmio, um elenco cheio de buracos, lesões pra burro, e muita dificuldade de coordenar o ataque. E o problema é que, pra consertar o ataque, ele deixa de se focar na sua especialidade, que é a defesa, e aí o Heat se ferra ainda mais por culpa das falhas defensivas. É preciso respirar e se concentrar em coisas específicas e transformá-las em padrão. Vamos ganhar os jogos com a defesa e se focar só nisso? Vamos. Vamos tornar o James Jones o arremessador designado e deixar ele em quadra o tempo todo? Vamos. O buraco no garrafão ainda vai continuar, LeBron e Wade ainda vão sofrer com o arremesso, e o Mike Miller ainda vai ter cara de menina lesionado no banco de reservas, mas as coisas já iriam melhorar um bocado.

>Dia cheio

>

Faz carinha de quem tá gostando

A gente já cogitou aqui no Bola Presa fazer um resumo da rodada anterior todos os dias. Mas nunca fizemos porque não temos como garantir que teremos tempo de fazer todo dia, e porque isso tiraria o nosso tempo de fazer textos mais profundos analisando as coisas com calma que, acho, é o que a gente faz melhor aqui no blog.

Acontece que ontem rolou tanta coisa, foram tantas estréias, são tantos comentários que fica difícil escolher um assunto pra falar. Sem contar isso: o que eu posso falar de mais profundo depois de um jogo só? Então hoje vai ser sobre a renca de jogos de ontem, certo? Só não se acostumem com isso, assim que cada time começar a ter mais de um jogo de história ficará mais fácil falar deles e voltaremos ao formato de sempre.

O que mais me chamou atenção na rodada de Itu de ontem (13 jogos é muita coisa!) foi a vitória do Cavs sobre o Celtics, óbvio! Muito irônico o mesmo time bater o super time do LeBron e depois perder das viúvas. Duas teorias explicam o resultado:

1. O Cavs jogou melhor e venceu
2. O Celtics entregou o jogo só pra zoar com a cabeça do LeBron

O mundo seria um lugar mais divertido se a segunda opção fosse verdade, mas não é bem assim. Outras coisas explicam de verdade a vitória do Cavs e todas podem ser interpretadas em declarações dadas no pós-jogo. O Ramon Sessions, que jogou no lugar do Mo Williams, machucado, disse que “o ginásio estava com uma atmosfera de jogo 7 da Final”, o Antawn Jamison, que jogou pouco, mal, mas fez cestas importantes no final, disse que “essa vitória foi para a cidade e para mostrar para os fãs que o Cavs vai sobreviver e que Cleveland ainda é um bom lugar para ver basquete”. E o Shaq, do outro lado, disse: “Acho que não jogamos duro o bastante com eles”.

Em outras palavras, a torcida e os jogadores do Cavs encararam essa primeira partida como a mais importante das suas vidas, a torcida apoiou o time como se fosse o jogo mais importante da história da franquia e o Celtics, um time velho, jogou pela segunda noite seguida e sem a motivação e a concentração necessária. E, falando em Celtics, vocês sabem porque o Rajon Rondo está jogando sem a sua tradicional hand band na cabeça? O motivo é absurdo: Ele era um dos poucos jogadores (JR Smith, Marcus Williams e Chris Wilcox eram os outros) a usar a faixa com o logo da NBA de ponta-cabeça.

E a partir desse ano o David Stern disse que os jogadores que usarem a faixa assim vão ser multados! Tem que deixar o Jerry West direitinho pra ele não ficar com todo o sangue na cabeça. Dá pra ser mais chato e pentelho que o Stern? O que deixa a história ainda mais estranha é que perguntaram da faixa para o Rondo durante a pré-temporada e ele disse que tinha parado de usar porque não estava mais a fim, essa nova regra veio só à tona numa entrevista do dono do Celtics, Wyc Grousbeck, a uma rádio de Boston. Alguém duvida que o Stern não só proibiu os jogadores de usar como de falar sobre o assunto? Eu não.

Teve gente na imprensa americana apostando em apenas 12 vitórias para o Cavs em toda a temporada. Eu acho isso um exagero descomunal. O time perdeu a sua peça mais importante, fato, mas ganhou um técnico de verdade e ainda tem bons jogadores, coadjuvantes, secundários, mas bons. A grande dúvida era como eles iriam encarar o campeonato, já que nos últimos anos entravam em quadra sabendo que eram um dos melhores times e pensando em título, jogar com ou sem confiança faz toda a diferença do mundo. Para o primeiro jogo a mentalidade deles foi perfeita, jogaram em um clima de “ele nos abandonou mas ainda temos uns aos outros”, mas será que dura 82 jogos? Será que sobrevive a uma sequência de derrotas?

O Cavs tem elenco para ser um time de meio de tabela, mas pode ser muito mais ou muito menos dependendo da motivação com que os seus jogadores vão ter em quadra. Se o JJ Hickson continuar jogando bem, claro, também ajuda.

Enquanto isso o novo time do LeBron faturou sua primeira. Se perdessem do Sixers seria demais! Um dia depois de encarar Shaq e Garnett no garrafão deve ser um alívio ver Elton Brand e Spencer Hawes na sua frente. O LeBron continuou cometendo muitos turnovers (9 na noite de estréia, 8 ontem), mas compensou com alguns bons passes e cestas, James Jones acertou 6 bolas de três pontos e Dwyane Wade foi o cestinha da partida com 30 pontos. Lado negativo? Lembram do clássico drible do Iverson no Jordan no seu ano de novato? Temos uma versão light com o novato Evan Turner e o D-Wade.

Aliás, depois de ser um desastre nas ligas de verão e de ter momentos péssimos na pré-temporada, Evan Turner, segunda escolha do Draft 2010, acordou e jogou muito bem ontem. Acertou 7 de 10 arremessos, fez 17 pontos, 7 rebotes e 4 assistências. Nada, nada mal! Outros novatos também se destacaram:

O DeMarcus Cousins foi pivô titular no Kings (Dalembert está machucado) e fez 14 pontos, 8 rebotes e 5 assistências. Wesley Johnson marcou 13 para o Wolves no mesmo jogo, e ainda deu essa enterrada só pra começar bem a carreira. No mesmo jogo o Kevin Love, estrela do Wolves, jogou apenas 23 minutos. Segundo o técnico Kurt Rambis foi porque “o Anthony Tolliver estava jogando de maneira extraordinária”. Ele jogou bem mesmo, é verdade, mas não dava pra usar os dois juntos? Tirar sua estrela do time, logo no primeiro jogo do ano, por causa do Tolliver? Acho que o Rambis acreditou que esse vídeo passou na ESPN:

O grande destaque entre os novatos, no entanto, foi o Blake Griffin. Sua primeira jogada como profissional foi essa:

Nada mal, hein? Foram 20 pontos, 14 rebotes e 4 assistências no total. Mas o Clippers é o Clippers e eles perderam do Blazers. Lembram que no preview deles eu tinha dito que o Baron Davis precisava voltar a jogar basquete? Pois é, ontem foram 8 pontos, 3-11 arremessos, 3 assistências e 4 turnovers. Errou todas as bolas de três que tentou e metade dos lances livres. Também foi assustador como o Clippers é ruim nos rebotes defensivos! O Blake Griffin em especial. Dos 14 que ele pegou 9 foram de ataque (DeJuan Blair parte 2) e só 5 de defesa, enquanto deixou o Blazers pegar 21 rebotes ofensivos. Em alguns momentos se via o Griffin e o Chris Kaman só olhando para o alto esperando a bola cair, sem fazer bloqueio em nenhum adversário. Marcus Camby fez a festa.

Outros momentos interessantes nos jogos de ontem. O Pistons (que teve o T-Mac zerado) vencia por 7 pontos quando faltava um minuto e meio para o fim do jogo, mas perderam. Para o Nets. Para o bendito Nets, que teve contribuição quase nula do novo zilionário Travis Outlaw (1-7 arremessos) e uma bola de três salvadora do outro estreante Anthony Morrow. Vai ser uma loooooooooooonga temporada para o Detroit Pistons.

O Atlanta Hawks venceu um Grizzlies sem garrafão. Marc Gasol está machucado e nosso gordinho-muso Zach Randolph caiu com as costas no chão ainda no primeiro tempo, tentou jogar no sacrifício (herói!) mas não deu certo. Imagina aqueles 900kg caindo com tudo nas costas, deve doer. O Hawks marcou 119 pontos e o Joe Johnson ao fim da partida disse estar apaixonado pelo esquema ofensivo do novo técnico Larry Drew. Segundo o jogador ele só não fez mais pontos nas muitas vezes que ficou livre porque estava excitado demais com o novo estilo de jogo, faltou calma. Vai ser legal ver como funciona esse ataque contra uma defesa de verdade.

Em um dos jogos mais empolgantes da noite o Chicago Bulls perdeu do Oklahoma City Thunder. Nada de surpresas ou bizarrices no jogo, tudo como o esperado: Show de Durant, Westbrook e Derrick Rose, milhões de rebotes para o Joakim Noah (18!) e o sempre esquecido Thabo Sefolosha fazendo todas as jogadas certas na hora certa para vencer o jogo. Vale uma olhada nos muitos melhores momentos do jogo.

No último jogo da noite, um presente de Golden State Warriors e Houston Rockets para todo mundo que tem seus jogadores nos seus times de fantasy. Foram números impressionantes pra todo mundo na vitória do Warriors por 132 a 128! 28 pontos para o Kevin Martin, 36 pontos e 16 rebotes para o Scola, 17 pontos, 16 rebotes e 6 assistências para o David Lee, 25 pontos e 11 assistências para o Steph Curry e um jogo NBA Live para o Monta Ellis: 46 pontos em 18-24 arremessos. Passar de 40 pontos com menos de 25 arremessos é para poucos, muito poucos. Só quem tem o Yao no time de fantasy que não ficou feliz, ele não jogou. Segundo as regras para se poupar nessa temporada, ele não joga jogos em dias consecutivos.

Hoje tem a estréia do Orlando Magic contra o Wizards do John Wall, não perco por nada nessa vida! Eu pareço empolgado com esse começo de temporada? Pareço? Pareço?

>Não é mais um preview

>

A beleza da NBA está de volta

Como o Rodrigo Alves disse no seu texto no Rebote, a noite de abertura da NBA foi divertida desde o Twitter até as quadras. No Twitter, geralmente um lugar desagradável onde tem mais gente tentando pagar de inteligente e/ou engraçado para as outras, o clima foi divertido, com comentários inteligentes, piadas, apostas e um monte de gente aprendendo a mexer no League Pass. Faremos uma análise do LP ainda essa semana, mas já avisamos aqui que durante essa semana ele está disponível de graça. É só entrar no site deles, se cadastrar e escolher o jogo que quer ver.

Ah, e também sei que não acabamos os previews antes do primeiro jogo! Faltaram Nuggets, Thunder e Knicks. Tudo culpa do Danilo, claro, nunca minha. Mas ele já cuidou disso e os links para todos os previews estão agora em um só post, esse aqui.

Eu não lembro de outra noite de abertura tão aguardada como a de ontem. Geralmente a NBA (ou mais especificamente esse cara) escolhe jogos que o pessoal está afim de ver, mas nunca tinha conseguido montar logo de cara um jogo com tamanha expectativa. Nada como a estréia do trio LeBron-Wade-Bosh contra o atual campeão do Leste que tem o seu próprio trio de ferro e mais Shaquille O’Neal, Rajon Rondo e Jermaine O’Neal. É muita gente boa ao mesmo tempo e um público na seca por basquete. Perfeito!

A partida começou com 8 jogadores na quadra que já foram All-Stars, os cinco do Boston e o trio do Miami. Apenas Carlos Arroyo e Joel Anthony destoavam. Pelo menos o porto-riquenho pode dizer que era uma estrela no basquete FIBA. No banco ainda tinham outros ex-all-stars, Jerry Stackhouse (recém-contratado pelo Heat), Jamal Magloire e Jermaine O’Neal. Em 2010 esse é um jogão em outubro, 10 anos atrás seria um jogão em fevereiro, no All-Star Weekend.

O Boston Celtics começou tentando explorar o pivô não-galático do Miami, jogando bastante a bola no estreante Shaq, que nas primeiras bolas errou arremessos ridículos embaixo da cesta, mas logo deu umas enterradas alucinantes, se pendurou no aro, pingou suor como um porco e até acertou lances livres, que foram motivo de vibração incontrolável da torcida.

Embalados por Shaq, por passes perfeitos do Rajon Rondo (17 assistências e nenhuma faixa na cabeça) e bolas de três do Ray Allen, o Celtics abriu quase vinte pontos de diferença já no primeiro tempo. Com uma defesa bem forte eles forçaram o Heat a apenas 9 pontos no primeiro período e 30 no primeiro tempo como um todo, marca pior do que o menor número de pontos marcados no primeiro tempo pelo Heat do ano passado. Sim, aquele time com Michael Beasley, Daequan Cook e Dorrell Wright. 

Muitas coisas explicam esse primeiro jogo, em especial o primeiro tempo, horripilante do Heat. Primeiro a falta total de entrosamento, o trio que controla a bola por 90% do tempo jogou junto só por 3 minutos durante a pré-temporada. Wade, machucado, mal treinou. E não é um time que tinha uma base e treinou pouco nos últimos meses, é um time que começou do zero. Também não é um time tradicional, com jogadores que se completam naturalmente, eles tem características conflitantes (tanto Bosh quanto Wade e LeBron gostam de segurar a bola e não são bons arremessadores, por exemplo) o que não significa que vão fracassar, mas que precisam de treino mais do que um time normal. Se você juntar um trio como Chris Paul, Kevin Durant e Dwight Howard, por exemploa coisa fluiria mais naturalmente.

Outra razão pode ter sido o nervosismo, afinal todos esperam o melhor time da história e eles tem uma reputação a zelar, deve bater um medo de fracassar. Alguns passes que eles deram para o meio da arquibancada e outras infiltrações precipitadas não foram só falta de entrosamento, foram desespero mesmo. Também não ajudou o fato deles terem o primeiro jogo fora de casa contra uma das melhores defesas da NBA nos últimos três anos! Se cometerem todos os mesmos erros de novo contra o Sixers aí sim o buraco é mais embaixo. O Celtics soube perfeitamente explorar as fraquezas que o Heat ainda tem: a falta de um pontuador dentro do garrafão (até LeBron tentou se arriscar lá dentro pra compensar, sem sucesso), a falta de arremessadores de longe (e meia distância) e assim deixou o garrafão congestionado para evitar as infiltrações.

No fim das contas, segundo o site HoopData, o Heat tentou 22 infiltrações, conseguindo finalizar 12 com sucesso, um número respeitável. Mas em todos os outros pontos da quadra eles acertaram 15 arremessos em 52 tentativas! O Celtics estava deixando o Heat arremessar porque estava um desastre. Era como se o outro lado tivesse 5 Rondos.

As coisas começaram a mudar quando o Celtics primeiro relaxou, fugindo do que estava dando certo e mostrando que eles também estão em ritmo de começo de temporada, depois mudou por completo, com o Heat chegando a diminuir a diferença para 3 pontos quando o Heat começou a jogar como, quem diria, o Cavs. Ironias da vida. Com Wade e Bosh no banco e jogando ao lado de Zydrunas Ilgauskas, Eddie House e James Jones o LeBron James fez o que fazia em Cleveland. Pegava a bola, recebia um corta-luz na linha dos três e atacava a cesta, aí era ou cesta, ou falta ou um passe para alguém na linha dos três. Básico, simples, Cavs.

Foi o bastante para colocar o Heat de volta no jogo, mas logo a defesa apertou e ficou aquele joguinho de LeBron tentando vencer sozinho de um lado e o Ray Allen matando o jogo com bolas de três do outro. Por um lado foi péssimo para o técnico Erick Spoelstra ver que vai ter muito trabalho pela frente e que durante esse trabalho vão ouvir piadas, críticas, vaias e gritos de “overrated” como da torcida de Boston, ontem. Por outro lado foi bom ver que depois de um jogo em que o time jogou de maneira mais desorganizada que a 25 de março em semana de Natal, perdeu só por 8 pontos, esteve perto da virada e mostrou alguns bons momentos na defesa.

Como tudo o que vamos falar em todos os posts nas próximas semanas, esses comentários sempre vêm com um “apesar de ser só o começo da temporada” embutido. Não dá pra querer achar que vai ser ruim assim pra sempre, mas também não dá pra ignorar que foi um fiasco.

O segundo jogo da noite foi Blazers e Suns em Portland. O time da casa começou bem, com Brandon Roy e Andre Miller mostrando algum entrosamento e sabendo dividir a responsabilidade da armação, mas o time não embalou porque LaMarcus Aldridge foi incap
az de tirar vantagem da sua estatura contra o Hedo Turkoglu. O Suns, mesmo sem convencer, jogou bem. Só foi estranho ver o Nash arremessando mais do que passando e triste ver o Turkoglu ajudando tão pouco, mas deu certo e no terceiro período eles estavam voando.

Porém, no último quarto um dos maiores candidatos a jogador que mais evoluiu na temporada, Nicolas Batum, fez 11 dos últimos 18 pontos do Blazers, que venceu o período final por 20 pontos de vantagem e levou a vitória pra casa. O Batum já era bom antes, ótimo defensor, bom arremessador e sabe bater pra dentro. Nesse ano como titular absoluto ele tem tudo pra ter grande destaque. Olho nele e peguem o rapaz na sua liga de fantasy.

Antes do jogo de ontem o próprio Nash disse que se estivesse vendo tudo de longe não apostaria no Suns como um time para ir para os playoffs. Bem racional da parte dele, mas o time já superou outras limitações de elenco antes e nem tudo está perdido, só vai ser bem difícil. Um bom começo seria o Nash confiar mais no Robin Lopez que, coitado, tentou brincar de Amar’e Stoudemire ontem e não recebeu um passe do Nash depois dos bloqueios que fazia, só ficava com a mão esperando a bola e nada aparecia.

No último jogo da noite tivemos o já famoso Bola Presa Classic. Meu Lakers contra o Rockets do Danilo. Finalmente a NBA nos ouviu e colocou esse jogo numa data importante. Antes da partida, claro, a entrega dos anéis de campeão para o Lakers. Em uma cerimônia fresca e ensaiada: o anel era dado para um jogador que pegava o microfone e chamava o coleguinha de classe. Para provar que era tudo ensaiado até elogiaram o Sasha Sharapova ao chamá-lo ao centro da quadra. O anel que eles ganharam era todo rico e brega, como sempre. Tem 16 diamantes, para simbolizar os 16 títulos do Lakers, pedaços de couro arrancados da bola usada no jogo 7 da final e a cara de cada jogador nos anéis. Doideira! Olha as fotos aí embaixo. Certo o Ron Artest que vai leiloar o dele.

O jogo de verdade começou com Aaron Brooks e Kevin Martin me dando a certeza absoluta de que vão ser a dupla de armação com mais bolas de três feitas na história da NBA. Aposto um chocolate nisso. E chocolate só não é a melhor coisa do mundo porque existe sexo, então a aposta é séria! O Rockets jogou muito bem durante toda a noite e até merecia a vitória, que só não veio porque o Shannon Brown resolveu achar que é o Anthony Morrow e acertou 4 bolas de três, quase todas no último período . E depois, quando o Houston vencia por um ponto a 18 segundos do fim, o estreante Steve Blake meteu uma bola de três para ganhar o jogo. Quem é Jordan Farmar mesmo? Não lembro. É muito difícil bater o Lakers quando Pau Gasol está bem (98% dos jogos) e as bolas de longe estão caindo.

O Lakers jogou o seu basquete preguiçoso de temporada regular. Muito bem durante uns momentos, relaxado em outros e bem sério quando a água bate na bunda nos minutos finais. Deu certo, mas o time ainda parece fora de ritmo, especialmente Kobe, que está bem lento na defesa. O Rockets pareceu mais entrosado, mais interessado e parece que vai dar trabalho pra valer. O Yao Ming jogou e até que tá bem para alguém todo quebrado, que não joga há um ano e que se move como se estivesse embaixo d’água. Mas o que me deixou mais surpreso foi ver como o Luis Scola pareceu mais à vontade no ataque no fim do jogo, chamando a responsa ao invés de aceitar ser coadjuvante. Ele é bom o bastante pra isso e sempre foi, mas no ano passado era mais comum a gente ver o Aaron Brooks querer bancar o herói.

Foi um bom primeiro dia, mas só o primeiro. Hoje tem mais 13 partidas, com quase todos os outros times fazendo seu primeiro jogo e aí vem a primeira grande dúvida da temporada: O que assistir no League Pass? Tem Miami tentando a sua primeira vitória contra o Sixers, a estréia do lixo do Cavs ou um potencial  jogão entre Bulls e Thunder. E mais tarda a estréia do Warriors sem Don Nelson e o primeiro jogo oficial do Blake Griffin, isso sem contar a estréia do Amar’e como um Knick e um empolgante Nuggets-Jazz. Por enquanto só sei que não vou ver Hawks contra o Grizzlies. Como eu vivi todos esses meses sem NBA todo dia?

>Preview 2010-11 / Houston Rockets

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Um dia comum na rotina de Yao Ming, após acordar e antes de passar na padaria


Objetivo máximo: Passar da primeira rodada dos playoffs pra mostrar que não foi sorte
Não seria estranho: Não se classificar para os playoffs, ficando na 9a posição
Desastre: Ter o Yao Ming contundido mais uma vez
Forças: Um elenco cheio de especialistas e disposto a jogar coletivamente
Fraquezas: A falta de uma estrela para decidir os jogos e séries mais complicadas, já que o Yao é de vidro
Elenco:










….
Técnico: Rick Adelman

Quando o Adelman assumiu o Blazers em 1989, o time era bom o bastante para chegar aos playoffs mas batia cabeça em quadra, não tinha identidade nem padrão ofensivo. Sob comando do Adelman, foram para os playoffs na temporada que ele assumiu e para a Final do Oeste nos três anos seguintes, ganhando o Oeste duas dessas vezes. Esse é um bom exemplo do que esse técnico pode fazer com um bom elenco. Quando assumiu o Kings em 98, tornou aquele elenco bacanudo num dos times mais legais de assistir de todos os tempos, levando-os a múltiplas finais do Oeste. O truque é uma versão modificada da “Princeton Offense“, de que tanto falamos no preview do Cavs. A versão do Adelman se foca mais no jogo entre dois jogadores do que no de três, costuma tirar os pivôs de dentro do garrafão para que eles possam passar a bola para jogadores cortando pelo fundo, e pede mais velocidade e correria ao invés da enorme quantidade de passes e jogo contido da “Princeton Offense”. Adelman gosta de contra-ataques e, assim como naquele Suns do Mike D’Antoni, insiste que os arremessos rápidos são melhores do que ficar passando a bola por 24 segundos. Seu ataque é criativo e instintivo, com pouca intervenção do técnico e muita liberdade para os jogadores. Os dois armadores trocam constantemente de papel um com o outro e em geral são os pivôs que iniciam as jogadas com um passe na cabeça do garrafão.
Todos os jogadores dizem que o sistema ofensivo do Rick Adelman é uma delícia de jogar, há liberdade para inovar e improvisar, velocidade e no entanto não tem porra-louquice, as movimentações são bem planejadas. O problema é que além de ser um sistema complexo para aprender e se acostumar, o fato de que ele precisa de criatividade e improviso exige jogadores inteligentes ou que, no mínimo, consigam manter calma e naturalidade nas movimentações. Além disso o sistema deve responder à defesa, sem que existam jogadas fixas, o que costuma deixar as estrelas de lado. Rick Adelman não vai chamar 40 jogadas seguidas para o Yao Ming, a bola deve chegar no pivô naturalmente, quando for possível, como resultado da postura da defesa. É comum ver estrelas jogando pelo Adelman sem receber a bola por longos minutos, o que não lhes deixa muito contentes, e no final dos jogos isso é sempre um problema. Os times de Adelman são famosos por amarelar nos jogos decisivos em parte porque não é natural para o sistema ofensivo colocar a bola nas mãos de um jogador só e deixá-lo decidir. O Kings fodão dos anos 2000 perdeu jogos fantásticos porque a última bola caía nas mãos de um Stojakovic livre – um baita arremessador que se borrava de medo de dar o último arremesso, mas que por estar livre deve receber as bolas no ataque de Adelman. 
O Houston sem Tracy McGrady e sem Yao Ming foi um sonho para o Adelman porque não havia qualquer estrela para encher o saco, seu ataque era seguido à risca, todo mundo recebia as bolas apenas quando elas faziam sentido, e a campanha da equipe foi fenomenal – mas não o bastante para ir para os playoffs numa Conferência Oeste disputada como nunca. Na temporada anterior, o Houston sem T-Mac e com Yao contundido levou o Lakers para um Jogo 7 na semi-final do Oeste, mas não foi o bastante para vencer. Ou seja, o esquema é lindo de se ver, envolve todo mundo, mas não costuma ser muito decisivo.
Além disso, o Adelman é famoso por saber lidar com todo tipo de personalidade. Ron Artest foi para o Houston por afirmar que o Adelman era o único técnico que o respeitava de verdade, e a postura “foda-se, faça o que quiser” do Adelman dá cabo de qualquer jogador-problema. No entanto, dizem que ele é meio relaxado, principalmente nos treinos, e deixa os jogadores livres demais às vezes. Não dá pra agradar todo mundo… 
…..
Esse Houston Rockets de agora levou bastante tempo para entender a fundo o sistema ofensivo do Rick Adelman. No começo, executavam tão mal no ataque que o Adelman tinha que chamar todas as jogadas, uma por uma, todos os jogos, na lateral da quadra. Aos poucos Aaron Brooks foi se acostumando com a armação, o elenco de especialistas sem estrela alguma abraçou a causa, os jogadores são incrivelmente inteligentes e executaram tudo com perfeição, e o Adelman pode dormir feliz mesmo com um elenco limitado. Em suas próprias palavras:
“Às vezes você tem alguns times que talvez não sejam tão talentosos quanto outros times, mas certamente dá para tirar deles o mesmo que você tiraria de times melhores. Se você consegue com que joguem com todo seu potencial, e joguem duro todas as noites e se esforcem todas as noites, isso já é satisfação. Você não vai ter sempre o melhor time.” 

Mas para vencer nos playoffs, o time precisa de ajuda. Apesar de já ter provado que pode jogar sem Yao Ming, aumentando a velocidade dos contra-ataques e se focando mais nos arremessos de três pontos, com Yao em quadra o time ganha um defensor embaixo do aro – mantendo a tática, implementada por Jeff Van Gundy, de fazer com que a defesa afunile os jogadores em direção do Yao e de repente se choquem numa parede de quase 2,30m. Além disso, Yao é um excelente passador da cabeça do garrafão, essencial para iniciar as jogadas de Adelman, e o time é muito melhor com ele em quadra. 

Infelizmente o pivô chinês será limitado a 24 minutos por jogo, o que não tem qualquer relação com sua sexualidade, mas é uma grande sacada para evitar lesões em um esqueleto que não foi feito para carregar aquele peso e aquela altura pulando de um lado para o outro numa quadra de basquete. Quando ele estiver em quadra, ótimo, mas quando não estiver caberá ao recém-chegado Brad Miller assumir a função de pivô passador e arremessador. Brad Miller teve o melhor momento de sua carreira jogando no Kings do Rick Adelman e mostrou ser um excelente passador, além de sólido arremessador de 3 pontos. Na maioria dos outros times, seria mal usado, mas ele nasceu para jogar para o Adelman. Agora, com e sem Yao, o Houston terá um padrão de jogo no garrafão e poderá correr menos, poupando um pouco o fôlego durante a temporada regular.

Como parceiros de garrafão de Brad Miller e Yao Ming, o Luis Scola vem de um Mundial espetacular e como sempre renderá bem no ataque com seu cérebro super-desenvolvido encontrando os espaços livres, enquanto Chuck Hayes cuidará da defesa apesar de ser anão simplesmente incomodando os adversários, cutucando a bola e sendo o marcador mais irritante de toda a NBA. Com a saída de Trevor Ariza, agora Shane Battier volta a ser titular, o que aumenta o QI da equipe em oito mil pontos, garantindo a defesa de perimetro e a movimentação impecável do ataque, com os clássicos arremessos de três da zona morta. Courtney Lee, também nova aquisição, deve ser o reserva do Battier nas funções defensivas enquanto Chase Budinger (que poderia ser estrela de vôlei mas escolheu ir jogar basquete mesmo sendo pior) e seus arremessos precisos de três substituirão Battier no ataque.

A aquisição mais importante da equipe, no entanto, chegou já na temporada passada, mas estava lesionada e demorou para compreender o sistema ofensivo. Trata-se de Kevin Martin, um dos melhores pontuadores da NBA e que detesta a ideia de ter que carregar um time nas costas. Agora, em plena forma física depois de um longo regime de reabilitação e treinamentos nas férias, diz estar pronto para tomar as rédeas do time quando for necessário. Ou seja, Kevin Martin não vai se importar de estar num esquema coletivo que não colocará a bola em suas mãos, mas se diz disposto a decidir as partidas com seu enorme arsenal de movimentos de infiltração (e capacidade mutante de cavar faltas). Ao contrário de T-Mac, que só rende quando joga com a bola nas mãos o tempo inteiro, Kevin Martin brilha por se movimentar bem, arremessar ao receber a bola depois do corta-luz, e pode manter a bola nas mãos justamente nos momentos em que o Houston (e o Rick Adelman, em toda sua carreira) mas sofre: nos minutos finais. Creio que Adelman deve ter percebido que seu time perfeito, sem estrelas, e seguindo seu plano à risca, não foi o bastante para chegar aos playoffs, e que será necessário abrir espaço para Kevin Martin resolver algumas partidas. Se estiver ao lado de Yao Ming, que deve ser poupado para os minutos finais dos principais jogos, o Houston pode ser muito mais forte do que se imagina, com um excepcional elenco de apoio carregando o time quando necessário durante a temporada regular.

>Por um basquete divertido

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Um tem cabeça quadrada, o outro tem mullets, mas no fundo são todos irmãos

A gente está andando devagar nessa semana de feriado, afinal todo mundo merece botar a cabeça pra fora de casa de vez em quando – especialmente depois de passar tanto tempo sentado na privada, já que um carinha leitor do Bola Presa que reclamou da minha ausência perguntando se eu estava com caganeira acertou em cheio. Mas a verdade é que o Mundial de basquete também caminha devagar, sem surpresas, cheio de lavadas, e o negócio só esquenta hoje às 15h, quando o Brasil enfrenta a Argentina  por uma chance de ir às quartas-de-final. Com uma vitória, dá até pra sonhar com uma semi-final – e nada mais – e voltar pra casa com gostinho de sucesso. Especialmente porque, em pleno feriado em que as pessoas estão caçando, esperançosas, fotos da Sandy pelada para se entreter, assistir a uma partida de qualquer esporte entre Brasil e Argentina soa muito tentador. Podia ser até partida de bocha, desde que a galera pudesse torcer contra a Argentina e alimentar o ódio idiota. Os caras moram aqui do lado, falam uma língua parecida (espanhol é português com sotaque), têm uma cultura muito próxima, jogam basquete pra caralho, e a gente insiste em torcer para que eles morram. Vai entender.

Uma vitória do Brasil vai fazer um monte de tiozinho gordo de bigode fedendo a churrasco prestar mais atenção no basquete apenas porque fizemos alguns argentinos perderem, mas acho que o esporte nem precisa de muitos tiozinhos gordos de bigode, é melhor mesmo que eles continuem só torcendo para o Flamengo. O que importa mesmo é que um monte de pirralinho que torce contra a Argentina no futebol pode se empolgar com a partida de basquete, parar de procurar as fotos da Sandy e resolver dar uma chance pro esporte, num efeito dominó que vai levar algum gordo de bigode a colocar mais investimento nas categorias de base. Ridículo que isso tenha que vir às custas de um ódio por gente que fale enrolado, assiste Chaves e usa mullets, mas nosso esporte precisa muito desse aumento na auto-estima – e aumentar a auto-estima quase sempre implica em diminuir, xingar e descer o cacete em outra pessoa. Aliás, nossa noção de esporte implica bastante em odiar outra pessoa, e muita gente só torce para poder odiar os rivais. Gosto de imaginar que os leitores do Bola Presa são diferentes, que estão mais abertos a pensar o esporte de outras maneiras, que acham uma besteira esse lance pseudo-patriota e se preocupam com o esporte em si, sem fronteiras, mas além da terrível verdade inegável – existem torcedores do Jazz que nos leem – também há o fato de que todo mundo tem um tio gordo que vai xingar os argentinos amanhã e talvez se empolgue de verdade com a partida. Minha torcida, portanto, mais do que por uma vitória brasileira, fica para que seja um jogo espetacular, daqueles com 80 prorrogações, pra deixar todo mundo impressionado e com vontade de lotar os ginásios no Brasil e assistir NBA em outubro. Mas torço um pouquinho, confesso, para uma derrota argentina em parte só para o Luis Scola parar de jogar esse Mundial idiota e ir descansar um pouco para a temporada que vem no meu querido Houston.

Meu time sempre sofreu demais com os torneios internacionais simplesmente porque o Yao Ming era obrigado a jogar pela seleção chinesa durante suas férias da NBA. Quando uma cúpula de dirigentes chineses e americanos se uniram para acertar os detalhes de seu ingresso na liga, assim que ele havia sido draftado, ficou estabelecido que a seleção da China seria sua prioridade. Nem por um segundo, após descobrir uma fratura no pé de Yao que poderia ter sido escondida até o fim dos playoffs, o Houston cogitou a possibilidade de comprometer a presença do pivô nas Olimpíadas. Yao foi retirado das quadras e começou um processo de reabilitação focado única e exclusivamente nas Olimpíadas da China, e é claro que ao voltar para o Houston não estava em plenas condições físicas e acabou se lesionando de novo – e de novo, e de novo, como bom produto “made in Taiwan”.

Recentemente o Yao Ming afirmou que cogitava a aposentadoria caso sua lesão não melhorasse, afirmando que a seleção chinesa teria que se virar sem ele, e eu afirmei que esse discurso era apenas uma desculpa para que ele não tivesse que jogar nunca mais pela China sem soar um traidor. Dia desses, veio a confirmação: Yao admitiu estar em plena forma física, voltou a treinar com bola sem limitações em Houston, e afirmou que sua entrevista havia sido mal entendida por aquelas bandas, que ele apenas estava se afastando da seleção chinesa finalmente. Seus minutos serão limitados nos primeiros meses de temporada, mas Yao está pronto para voltar a ser titular do Rockets – e passar longe da seleção pelo resto da carreira.

Enquanto isso, seu parceiro argentino de garrafão não dá sinais de que um dia abandonará a seleção. Dá pra imaginar fácil o Luis Scola entrando em quadra de cadeira de rodas, vão ter que amarrar o pé dele na mesa da cozinha para evitar que ele tente entrar em quadra pela Argentina aos 60 anos de idade. Mas, ao contrário do peso patriótico que Yao carregava injustamente nas costas, Scola afirma que só quer jogar porque “acha divertido”. Admite que gosta de competir, seja qual torneio for, e que se diverte sendo a estrela, a peça mais importante da equipe – coisa que não acontece no Houston Rockets, em que ele tem papel secundário. Para Luis Scola, jogar pela seleção é uma chance de ser a maior arma no ataque, ganhar jogos sozinho, assumir responsabilidades. E faz tudo isso com tanta facilidade que chega a afirmar que os jogos pela Argentina são, pra ele, preparação para a temporada da NBA.

Cada vez mais essas partidas internacionais perdem a importância, e não é apenas no basquete: todos os outros esportes, até mesmo o futebol, sentem o fenômeno. Os melhores jogadores do mundo participam de ligas de alto nível – seja a NBA, seja o basquete europeu – em que podem enfrentar os outros melhores jogadores do mundo. A nacionalidade vira um troço um tanto secundário quando um russo defende uma equipe grega, jogando ao lado de um americano, ou quando um espanhol é campeão da NBA ao lado de um esloveno e um belga. É claro que tem o lado financeiro, são os times que pagam os salários dos jogadores e eles muitas vezes exigem dedicação exclusiva, mas tem também um outro fato mais simples: não dá pra se ter tudo, abraçar o mundo. O corpo humano não aguenta. Se o jogador fica exausto jogando pelo seu time e ainda vai jogar pela seleção nas férias, vai ter um rendimento ruim nas duas competições. Quando se dá ao corpo o devido descanso, na maior parte das vezes é preciso escolher – e aí a escolha é óbvia, opta-se pela melhor liga, pela de mais evidência, pela de mais estrelas, pela de maior salário, e com isso o basquete de seleções fica em segundo plano. Num mundo em que as ligas são tão internacionalizadas, a simples ideia de um torneio entre seleções faz cada vez menos sentido e ele vai sendo deixado de lado. Não é babação de ovo em cima da NBA, como dizem que a gente faz, que “eles são soberanos”, porque o mesmo se aplica a qualquer campeonato europeu por aí. O nivel é alto, tem gente do mundo inteiro, e jogar por uma seleção só acaba tendo valor em casos muito específicos – tipo o Brasil, que precisa chamar atenção para o seu basquete, ou
o Scola, que está se divertindo.

A Argentina de Scola, campeã olímpica, teve um valor muito maior do que forçar os americanos a levarem seus principais jogadores para retomar o posto de vencedores (até porque eles já mostram que não precisam dos melhores jogadores num troço bobo como o Mundial). Scola e seus amigos provaram que os melhores jogadores de basquete do planeta podem estar em qualquer lugar, até mesmo num país cheio de mullets e tango na América o Sul. Pode até ser na China, em que os habitantes deveriam ser supostamente pequenos e frágeis, ou na Grécia, ou na Espanha, ou na Turquia. Todo mundo agora joga basquete de alto nível, esse posto de “país número um do basquete” é terra de ninguém, e ele sequer faz mais sentido e nem é mais necessário. Juntem gregos, turcos, espanhóis e argentinos e misturem tudo, em quantas ligas pudermos, as mais divertidas possíveis. É só isso, sem ter que pisar em ninguém, nem afirmar a nação de ninguém. Para quê tocar hino antes do jogo? O basquete é de todo mundo.

É por isso que o Luis Scola é um monstro absurdo: além de jogar na NBA e na seleção sem se contundir ou se cansar, além de ter mostrado que é um dos melhores do planeta mesmo sendo argentino e sendo incapaz de pular a altura de uma gilette, ele joga para se divertir, para aceitar papéis diferentes, para variar. Não perde um jogo pela seleção da Argentina, mas sabe que sua prioridade é o Houston, em que ele divide o garrafão com um chinês e enfrenta tantos estrangeiros quanto é possível.

Para a partida de hoje entre Brasil e Argentina, então, basta que ela seja divertida, muito divertida. A pataquada de seleção vai ficar de lado se todo mundo que acompanhar o jogo se maravilhar com a beleza do espetáculo, e resolver acompanhar os trocentos torneios sem fronteiras – não apenas a NBA, repito – a que temos acesso hoje em dia e que não estavam ao alcance de qualquer um alguns anos atrás. A internet faz mágica, manda as fronteiras pela privada porque podemos acompanhar a tudo, e ao vivo. Então, mesmo em caso de derrota do Brasil, esteja pronto para distribuir links, blogs, canais de televisão e informações úteis para o seu tio gordo de bigode. Se ele se divertir, vai querer mais – e todo o resto é desimportante. Se for bacana, a seleção vai ter desempenhado mais do que bem o seu papel. Agora, por outro lado, se der pancadaria com a Argentina… aí fizemos papelão, pega a participação do Brasil e joga no lixo. Precisamos de basquete bonito e bem jogado, então minha principal preocupação é justamente essa: que não haja pontapés.

>Yao e a seleção brasileira

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Yao e Nenê têm tanto em comum que até andam de braços dados

Dia desses, Yao Ming afirmou em entrevista que se aposentará caso sua lesão no pé não evolua como esperado, que seu físico precisa ser poupado e que deixará de defender a seleção chinesa. Não se trata de um aviso de aposentadoria e nem é razão de pânico em Houston. Ao contrário do que se imaginava, sua lesão teve recuperação acima da esperada e Yao está em excelente forma física, pronto para atuar no primeiro jogo do Rockets na temporada. A afirmação de Yao Ming foi dirigida, implicitamente, ao seu país natal. Depois de anos sacrificando seu corpo pela seleção chinesa, Yao tentou se livrar desse fardo sem soar um desertor ou traidor.

Num dos posts mais sérios do Bola Presa, comentei sobre o papel que o chinês teve em aproximar duas culturas tão distintas. A China deixou para trás velhos esteriótipos e valores e rendeu-se a um modo americano ao mesmo tempo em que Yao mudava seu modo de agir e jogar dentro das quadras. Foi um projeto longo com seu ápice nas Olimpíadas, quando a China provou ao mundo que não era um país bizarro em que se come baratas, é apenas outro país com shoppings, grifes, marcas, muito dinheiro, e força para vencer no quadro de medalhas. Yao não apenas foi o pilar da campanha digna da seleção chinesa de basquete nas Olimpíadas, foi também responsável por uma missão diplomática: aos americanos, apresentou uma China simples e digna de respeito nas quadras e fora delas; aos chineses, apresentou os Estados Unidos como algo que pode ser tocado, compreendido, imitado. Quanto mais americano o Yao se tornava, melhor ele unia as duas culturas rumo às Olimpíadas. Lá, todo mundo se deu as mãos e agora ninguém tem medo da China ser “comunista” e nem acha que os chineses são fracotes, desnutridos, pobres ou que ficam citando pérolas de sabedoria. O projeto está terminado, a China cresce vertiginosamente, Yao é um ídolo que ficará para a história, e os Estados Unidos acham tudo isso bonitinho, são parceiros. Pronto. Agora, finalmente, o pobre pivô pode escapar de jogar por aquela seleção capenga.

É cada vez mais normal, tanto no basquete quanto no futebol, jogadores priorizarem suas equipes ao invés de se dedicarem às suas seleções. Na NBA, cada vez mais as grandes estrelas pedem dispensa de suas seleções para poder descansar, treinar, se concentrar em seus times. Isso faz muito sentido em nossos tempos. Vivemos na geração da internet, em que as fronteiras físicas são cada vez mais arcaicas e desnecessárias. Estamos ligados às pessoas por interesses em comum, não importando em que país vivam, e não estamos presos a um modo de pensar ou de agir exclusivo dos nossos vizinhos. Não existem mais limitações geográficas, tenho mais a dizer a um sueco fã do Houston Rockets do que teria a um brasileiro torcedor do Ipatinga – e agora eu posso dizê-lo. Antes, jogar por uma seleção era amor à pátria e a única chance de que algumas estrelas pudessem jogar em seus países, na frente de seus amigos, parentes e compatriotas. Agora, pátria é um conceito que definha até à morte, podemos acompanhar as nossas estrelas – e as estrelas de qualquer país – através da televisão e da internet, podemos eleger nossas estrelas e nossos times graças a afinidades de estilo ou ideologia, e não por terem nascido dentro da mesma linha imaginária em que nascemos. Recentemente, sem televisão, assisti à final do Campeonato Paulista numa transmissão pela internet de um canal polonês. Eles podem torcer para o Santos ao invés de para um time mequetrefe da Polônia. Bobagem essa história de “amor à pátria” quando sequer compreendemos mais o conceito de pátria. Podemos ver o Barcelona e assistir ao campeonato de handball polonês, para que servem as fronteiras? Frente a um basquete nacional de péssima qualidade, podemos assistir à NBA e escolher nossas estrelas entre as que mais se encaixam em nossas crenças pessoais.

Não faz mais sentido o Yao se sacrificar para jogar por uma seleção. Mesmo ele, que carregava todo um projeto cultural nas costas, pode se ver agora livre dessa bobagem. Yao chegou à NBA com a temporada já começada, quando novato, porque estava treinando com seu país. Abandonou o Houston com uma fratura por stress porque precisava se poupar para as Olimpíadas. Adquiriu a tal fratura por ter jogado durante as férias por sua seleção. Desde que entrou na NBA, Yao nunca teve férias graças à seleção chinesa. Suas lesões, cansaço, fraturas, tudo resultado de uma temporada cruel de 82 jogos e de uma seleção cruel que tinha algo a provar para o mundo. Até que uma lesão muito séria lhe tirou de quadra no meio de uma série de playoffs, não foi capaz de jogar durante toda a temporada passada, e agora volta debilitado ao time. Apenas se tiver seus minutos limitados em quadra e férias ao fim de cada temporada, Yao poderá render alguns anos ainda. Para garantir isso, o Houston trouxe de volta Luis Scola, que chuta traseiros no garrafão mesmo sem conseguir pular um centímetro sequer, e adicionou Brad Miller, um dos melhores pivôs de todos os tempos quando se trata de arremessar e passar a bola. O Houston disse que pagaria o preço que fosse para manter o Scola, ele segurou as pontas de um time sem garrafão, é muito consistente, ganhou alguns jogos sozinho, tem cérebro pra jogar com o Rick Adelman e quebra até um galho de pivô sempre que precisa. O Brad Miller já foi mais na cagada, ele foi disputado por muitos times mas topou ir para Houston apenas pelo carinho que tem pelo Rick Adelman, já que jogou pelo técnico em seus tempos de Kings. Assim como Yao prefere jogar arremessando e dando passes na cabeça do garrafão, Brad Miller passou a vida fazendo justamente isso. Na verdade, o papel que Yao exerce no time é apenas uma imitação do que o Brad fazia no Kings antigamente. Nada melhor, então, do que trazer o original (mesmo que velho e empoeirado) para dar descanso ao Yao. A situação não poderia ser melhor para o chinês, que terá dois grandes jogadores de garrafão pela primeira vez na vida, poderá descansar vários minutos por jogo, e conseguirá pela primeira vez dedicar-se exclusivamente à NBA. Para o Houston, o que parecia um projeto de reconstrução virou de repente um time promissor e imediato: McGrady deu o fora e cedeu lugar para Kevin Martin, um dos melhores pontuadores da NBA, e até o armador reserva Kyle Lowry, que é bizarramente essencial para o time, foi recontratado. Reconstrução mesmo precisa rolar na seleção chinesa, mas isso é outra história.

Curiosamente, apesar de minha felicidade com a fuga de Yao da seleção e nossa atitude contra o conceito tolo de “patriotismo”, estou torcendo muito é pela seleção brasileira que disputará o mundial de basquete agora no fim de agosto. Em geral, não vemos porque dar cobertura especial para Leandrinho, Nenê ou Varejão apenas por eles terem nascido na mesma linha imaginária em que nascemos, mas dessa vez o caso é especial. Como sempre, faremos uma cobertura do Mundial de Basquete assim como fizemos das Olimpíadas, com foco nos jogadores da NBA, mas comentaremos bastante da seleção brasileira simplesmente porque nela reside as chances do crescimento do esporte em nosso país. Todos nós sabemos do apuro que é acompanhar ou praticar basquete no
Brasil, de como falta apoio, incentivo, verba e até credibilidade. Nosso basquete esteve afundado durante décadas em corrupção, amadorismo, mal gerenciamento, foi ignorado pela mídia e pelas torcidas. Nós aqui do Bola Presa já tentamos, muitos anos atrás, levar a prática do basquete a sério, e recebemos muitos e-mails de gente que tenta seguir carreira na área, e portanto estamos cientes das dificuldades. O basquete precisa ser levado a sério no Brasil para que surjam reais oportunidades de praticar, acompanhar, torcer e escrever sobre o esporte que amamos.

Nossa postura por aqui sempre foi a de acompanhar o melhor basquete do mundo, afinal basquete é basquete, não importa o país, e a atenção do público brasileiro cresce cada vez mais com relação à NBA nos últimos anos. O público do Bola Presa aumenta mês a mês, sem parar, e tratamos isso como um interesse legítimo em basquete, puro e simples. Nosso formspring fica cada vez mais abarrotado de perguntas de iniciantes, gente querendo saber quais são as regras do esporte, onde se assiste, quem são as estrelas. E é tudo molecada, gente que está chegando agora e que não está sofrendo com a saída do Jordan, está é se divertindo com a última temporada do Kobe. Isso é ótimo, faz o esporte crescer, e o Bola Presa sempre teve a intenção de tornar a NBA mais fácil, gostosa e divertida de acompanhar num país com tão pouca cobertura de qualidade a respeito.

No entanto, para que as mídias convencionais levem basquete a sério, para que exista verba para as categorias de base, para que possamos assistir basquete ao vivo de qualidade, não adianta só a NBA. Precisa haver sucesso na seleção. A gente percebe bem rápido que brasileiro gosta mesmo é de torcer pela seleção brasileira. O patriotismo cada vez mais vira farofa, todo mundo tem camiseta do Barcelona e tem carinha aí querendo arrancar cabeças rivais porque torce para o Utah Jazz mesmo tendo nascido no Acre, mas mesmo assim fica todo mundo louco para acompanhar a seleção brasileira. Confesso que não entendo muito bem, assim como não entendi o motivo de tanta gente que achava a seleção do Dunga repulsiva ter torcido mesmo assim ao invés de torcer por outras seleções mais legais, mas o fenômeno é óbvio e precisamos aceitá-lo. Para o esporte ser levado a sério aqui por essas bandas, a seleção brasileira precisa ter sucesso nesse Mundial de Basquete.

Enquanto Yao tira férias de uma camiseta vermelha para se focar em outra, a do meu amado Houston Rockets, os jogadores brasileiros da NBA precisam se concentrar na seleção brasileira acima de tudo. Num momento em que seleções de países fazem cada vez menos sentido, a China dependeu da sua para mudar toda uma cultura, e agora dependemos da nossa para que o esporte que amamos receba o apoio que merece. Não faz sentido o basquete ser deixado de canto por aqui e a garotada ter tanta dificuldade em conseguir jogar seriamente. A solução, bizarramente, está nas mãos de Nenê, Varejão, Splitter e Leandrinho. Depois de tanta incompetência e falhas de tantos dirigentes por anos e mais anos, o peso acaba caindo nos jogadores que deveriam estar se esforçando é por suas equipes, que sempre lhes deram plenas condições de atuar em alto nível. Mas, assim como ocorreu com Yao, às vezes os jogadores precisam assumir pesos que não são seus. Desempenhar funções maiores do que eles mesmos.