Comentei nessa semana, na nossa página no Facebook, que estava pensando em falar de NBB aqui a partir da próxima temporada. Não decidi absolutamente NADA de como será o próximo ano do blog, mas andei pensando nisso e queria saber o que nossos queridos e amados leitores achavam da ideia. Em geral as respostas ficaram entre duas variáveis: (1) Sim, vai ser legal e (2) Tudo bem, desde que não deixem a NBA de lado.
A ideia não é deixar a NBA de lado, mas apenas dar uma mudada no blog. Acompanhei o crescimento do basquete aqui no Brasil nos anos em que trabalhei como assessor no Paulistano e me sinto interessado e informado o bastante para fazer uma cobertura. Também vai ser legal poder escrever do basquete com maior chance de ir aos jogos, conseguir eventuais entrevistas e oferecer material de primeira mão. Na NBA, que pretendo continuar acompanhando com textos enormes e analíticos como sempre, quase sempre somos obrigados a opinar apenas depois de ler o que foi dito lá fora.
De qualquer forma, foi uma feliz coincidência que dias depois dessa mini enquete facebookiana, o Bala na Cesta chegou com o furo mais interessante do ano no basquete brasileiro: a NBA e o NBB estão próximos de fechar uma parceria de três anos! Parece até combinado. Interessante que você leia, também, a análise que o Bala já fez no blog dele sobre o assunto.
Como vocês viram por lá, a parceria ainda não foi oficialmente assinada e anunciada, mas só um desastre poderia cancelar. Sem ser oficial e com os dois lados mudos, só podemos especular a extensão do acordo, e é isso que eu vou fazer aqui!
Começamos comentando o mais óbvio, os motivos que levariam a Liga Nacional de Basquete, que gere o NBB, a assinar uma parceria com a NBA. Há 2 anos que a liga tem dificuldade de encontrar grandes patrocinadores e, sem dinheiro, nada funciona como deveria. O grande mérito da história do NBB são as novas ideias para criar uma liga moderna e organizada, mas sempre o progresso para quando o assunto dinheiro bate na porta. Eles sabem que a liga precisa investir mais em comunicação? Sim. Que sem vídeos dos jogos é difícil atrair novos fãs? Sim. Que times fracos e muito concentrados em só uma parte do país não ajuda na imagem nacional da liga? Sem dúvida. Mas como resolver isso sem as verdinhas? Muitas das responsabilidades acabam ficando nas mãos de clubes, que nem sempre dão a importância necessária ou tem o dinheiro para investir corretamente em todas as áreas.
Nos últimos anos vimos alguns times não conseguirem o mínimo de dinheiro para participarem do campeonato e outros, em outros cantos do país, terem o projeto, a ideia, o público, mas não conseguir tirar a equipe do papel. Tem gente interessada, existem projetos, mas sempre param na grana e a liga não pode ajudar porque ela mesma sofre nas verbas.
A chegada da NBA pode resolver todos esses problemas de uma vez só. Só colocar o nome da liga americana ao lado de alguma coisa que deve ficar umas 100 vezes mais fácil atrair investimento e patrocínio, sem contar o próprio dinheiro que a NBA tem e pode usar para investir em um novo mercado. Também podemos acreditar que eles vão saber usar a grana. Apesar de novos no ambiente brasileiro, tem experiência de décadas e décadas com logística do esporte, marketing esportivo, arbitragem e na evolução de questões técnicas do jogo. TUdo o que precisamos por aqui. Ou seja, não só eles vão chegar aqui dizendo que é importante transmitir jogos pela internet, eles vão dizer que sistema usar, como cobrar, quanto cobrar e como exibir.
Que outra chance a Liga Nacional de Basquete teria como essa? Se associar com alguém que tem dinheiro, reconhecimento na área e know-how de tudo o que envolve esporte. Topar a parceria, seja ela como for, deve ter sido bem fácil. Fica a curiosidade, por enquanto, para ver como isso influencia a outra parceria importante da Liga, a com a Globo, que sempre concentrou a questão da comunicação do campeonato.
O que não devemos esperar, porém, é uma revolução imediata. Posso não ser nenhum mestre em negócios, mas imagino que não se chegue num país estrangeiro, com outra cultura, e se mude tudo de uma vez para deixar o mais ianque possível. Se não dá certo nem com redes de fast food, não dará com uma liga de basquete. Eu apostaria que o primeiro ano será mais de consultoria do que qualquer outra coisa. Dá pra imaginar uma equipe da NBA designada para acompanhar a temporada do basquete nacional para ver os problemas, imaginar soluções e aprender sobre como lidamos com o esporte por aqui.
Nos últimos dias eu pensei bastante sobre os motivos que levou a NBA a pensar nessa parceria e achei algumas boas razões, embora só eles possam, um dia, realmente listar tudo o que passou na cabeça de negócios dos americanos. Pensem bem, qual seria o caminho natural para uma parceria da NBA em termos de basquete? A Europa. A aproximação até tem acontecido nos últimos anos: diversos amistosos acontecem nos EUA e na Europa, alguns times americanos fazem pré-temporada por lá e até na série 2K já vimos times do velho continente. Mas imagino (relembro, tudo aqui é especulação minha) que algumas barreiras são difíceis de transpor: por exemplo, as ligas europeias não veem a NBA mais como rival do que como parceira? E como lidar com o fato de que o “basquete europeu” é, no fim das contas, uma soma de diferentes ligas, países e com líderes distintos?
Por exemplo, acho que a ACB espanhola se interessa muito por amistosos contra times da NBA, mas uma parceria mais profunda do que isso iria significar o que? Certamente alguns dos salários milionários, em euros, que Real Madri e Barcelona gastam são para segurar por lá astros que poderiam facilmente jogar em muitos times da NBA. É estranha uma parceria entre ligas que lutam pelos mesmos atletas, muitas vezes bem novos e promissores. E se é fechada uma parceria com a Espanha, que já é bem autossuficiente e não desesperada como a LNB, como lidar depois com os times russos, gregos e turcos? É muita dor de cabeça para se meter em um mundo onde o basquete já está enraizado, tem sua cultura e seus grandes campeonatos.
E aí eles podem desviar o olhar para o Brasil: 200 milhões de habitantes, economia forte, público consumidor de basquete, 5º país que mais tem assinantes do League Passs da NBA. O nosso país consegue, ao mesmo tempo, ter história em basquete, com títulos, ídolos e praticantes; mas também não ter muitos times tradicionais, ricos ou mesmo uma liga forte e estabelecida. Para a NBA, o Brasil é como uma tela em branco onde eles podem intervir e se fazer como desejam e, melhor, sem ter que explicar o be-a-bá durante o processo. Pensem bem, a MLB também pode ver no Brasil um país de 200 milhões de habitantes e que não tem liga de beisebol forte, mas aqui eles perderiam uns bons anos só para nos convencer que beisebol é um esporte de verdade e que vale a pena passar 5 horas num estádio enquanto se aprende as regras. O basquete é jogado, aceito e entendido. Mesmo quem não acompanha, não estranha ver uma tabela por aí, sabe o que é e não enxerga como “esporte americano” ou coisa do tipo. É uma situação única e ideal para ser aproveitada.
Como eu disse antes, podemos apenas especular o que essa parceria vai trazer a curto e longo prazo, mas eu pensei em coisas que poderiam ajudar os dois lados, tornando o NBB uma liga mais interessante e, ao mesmo tempo, útil para a NBA. Isso, claro, indo além do mais básico: uma liga forte no Brasil rende mais fãs do basquete que, sem dúvida, vão ligar no League Pass para ver os melhores do mundo.
Liga Menor: Há tempos que se discute nos EUA a criação de Ligas Menores, subdivisões, como no beisebol, onde os times da NBA iriam trabalhar os seus jovens jogadores. A ideia mais extrema, longe de virar realidade, teria jogadores saindo do colegial e pulando a faculdade para irem se desenvolver nessas D-Leagues até serem, enfim, chamados para a NBA. Os times profissionais teriam mais controle sobre a formação dos atletas e estes ganhariam salários ao invés de serem escravos das universidades.
O Brasil poderia servir como uma “liga menor” para o desenvolvimento dos mais diversos tipos de atletas. O Houston Rockets descobriu um promissor pivô uruguaio? Bora mandar ele jogar em Bauru por uns dois anos para que os scouts deles o observem de perto. Os salários podem ser pagos por um dos times, pelos dois ou seja lá como for melhor para todos os lados. Talvez isso não funcione com todos, claro, talvez um jovem americano não se sinta à vontade de atravessar o mundo para se desenvolver aqui, mas certamente seria um caminho para talentos latinos, incluindo os próprios brasileiros. Já pensou o NBB infestado com os melhores jogadores argentinos, uruguaios, venezuelanos, dominicanos e porto-riquenhos? Seria demais!
Intercâmbio: Os EUA produzem técnicos a rodo, desde ex-jogadores até estudiosos da área. Agora, no mundo das estatísticas e análise tecnológica do esporte, diferentes empresas aparecem todos os dias com novas ideias e inovações. Com concorrência na NBA, muitos deles poderiam vir para o Brasil para ganhar experiência e, ao mesmo tempo, ajudar em nosso desenvolvimento técnico. E que tal um combinado jovem do NBB disputando as Summer Leagues, como já fazem com a D-League?
Mão de obra: Comprar uma empresa menor é também garantir que tudo revelado por lá pode ser aproveitado pela irmã mais velha. Pensando em longo prazo, a NBA pode investir no NBB para ter acesso mais rápido ao que for produzido aqui. A princípio pode ser apenas o que temos de melhor, os atletas, mas quem sabe, no futuro, também não surjam soluções em outras áreas como o marketing esportivo e a medicina esportiva.
Laboratório: Nos últimos anos virou moda a NBA discutir mudanças de regra, calendário e estrutura do campeonato. Já falaram em uma “Copa” no meio da temporada, valendo um segundo troféu em jogos únicos de mata-mata; linha de quatro pontos; mudança no sistema de faltas técnicas e faltas intencionais; quadras maiores; sistema de rebaixamento. Até o fim das conferências e mais viagens entre os jogos podem ser experimentadas por aqui! Será que o nível do basquete daqui cairia se existissem times em todos os lados do país e os times viajassem mais que o normal? Teste no Brasil.
Liga Sul-Americana: Não podemos esquecer que embora o Brasil seja o ponto de partida na América do Sul, não precisa ser o único atingido. A NBA tem ambição internacional e eu não me surpreenderia se dentro de alguns anos, eles sugerissem a adição de equipes de Buenos Aires, por exemplo, no nosso campeonato. Seria o nosso Toronto Raptors, útil para atrair até mais argentinos, celeiro próspero de jogadores com potencial de NBA.
Sei que talvez não seja tão bom para nossa autoestima nos enxergar como laboratório e fornecedor de mão de obra para um país rico, mas temos sempre que lembrar que há poucos anos nós não tínhamos campeonatos organizados no país, que a Confederação nacional é uma várzea e que passamos mais de década sem pisar nos Jogos Olímpicos. Difícil sair da lama e ser o poderoso logo de cara. De qualquer forma, assim como estar mal das pernas não era motivo para aceitar todas as ordens da Globo, o mesmo vale para a NBA, embora eu ache que a liga americana tem mais interesse em ver o desenvolvimento técnico do basquete daqui do que a emissora de TV.
Posso estar indo longe demais, admito. Talvez a ideia da NBA seja só ajudar com o básico (estrutura, logística, investimento e comunicação) e manter um elo fechado com um mercado em expansão, mas as possibilidades estão aí e o tempo nos dirá a ambição de cada parte.